Em choque com o Direito Tributário e seus pilares, a medida expõe rupturas para a segurança jurídica e a confiança legítima dos contribuintes
Por Vicente Alvarez e Reinaldo Nagao
Em resposta aos impactos devastadores da pandemia de Covid-19, especialmente no setor de eventos, o legislador brasileiro instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), por meio da Lei nº 14.148/2021. Este programa emergencial, reconhecendo as dificuldades enfrentadas pelo setor, estabeleceu benefícios fiscais substanciais, incluindo a redução para zero das alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS por um período de 60 meses, visando proporcionar um ambiente propício para a recuperação e estabilização financeira das empresas afetadas.
No entanto, a recente Medida Provisória nº 1.202/2023 introduziu alterações significativas, revogando os benefícios fiscais estipulados pelo Perse, com efeitos diferenciados para o IRPJ a partir de 1º de janeiro de 2025, e para a CSLL, PIS e COFINS, a partir de 1º de abril de 2024. Tal medida suscita profundas preocupações jurídicas e econômicas, dado que contraria diretamente princípios basilares do Direito Tributário, como a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima dos contribuintes.
A jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal reconhece a alíquota zero e a isenção como institutos equivalentes para fins tributários, ambos configurando mecanismos de intervenção econômica com finalidades extrafiscais. Essa equivalência jurisprudencial sublinha a importância da manutenção desses benefícios fiscais como ferramentas de política econômica, especialmente em momentos de crise, visando a sustentabilidade de setores estratégicos para a economia nacional.
A alteração unilateral e prematura das condições estabelecidas pela Lei nº 14.148/2021 pela MP nº 1.202/2023 não apenas viola o princípio da segurança jurídica, mas também desconsidera o impacto duradouro da pandemia sobre o setor de eventos. Além disso, a revogação dos benefícios fiscais antes da conclusão do prazo estipulado representa uma ruptura da confiança legítima depositada pelos empresários nas políticas públicas, comprometendo a recuperação econômica do setor e afetando negativamente a geração de empregos e renda.
Ademais, a medida provisória em questão impõe uma incerteza jurídica que prejudica o ambiente de negócios brasileiro, minando a confiança de investidores e empresários na estabilidade das regras fiscais e na previsibilidade das políticas governamentais. Essa incerteza, por sua vez, pode restringir os investimentos necessários para a retomada econômica, afetando não apenas o setor de eventos, mas a economia como um todo.
Em síntese, a revogação antecipada dos benefícios fiscais do Perse contradiz os objetivos da Lei nº 14.148/2021 e os princípios fundamentais do Direito Tributário, além de comprometer seriamente a recuperação do setor de eventos e a estabilidade econômica nacional. Portanto, é imperativo reavaliar a aplicação da MP nº 1.202/2023 à luz dos princípios de segurança jurídica, confiança legítima e intervenção econômica, assegurando, assim, a proteção dos direitos adquiridos e a previsibilidade jurídica e fiscal.
Conversar